Na semana de 23 de outubro de 2021, a Espanha perdeu uma oportunidade significativa de elaborar uma lei que regulamentasse o uso de cannabis para fins terapêuticos e recreativos. O PSOE, o PP e o Vox votaram contra o projeto de lei Más País. Esta decisão não afeta o outro grande negócio de cannabis, que está apenas começando a decolar na Espanha e movimenta US$ 2 bilhões nos EUA.
Estamos falando do negócio do canabidiol, comumente conhecido como CBD. É um dos canabinoides encontrados na planta Cannabis sativa e não é psicoativo. Ou seja, não causa efeito psicoativo, nem altera o estado de consciência, nem causa dependência. É usado para tratar dores crônicas, insônia e ansiedade, entre outras doenças.
É um negócio legal em muitos países, incluindo a Espanha. Isso se deve principalmente a dois motivos: a falta de regulamentação específica e a exigência europeia de que a cannabis contenha menos de 0,2% de tetrahidrocanabinol (THC), o composto que causa a psicoatividade pela qual a cannabis é famosa. Seu cultivo, por exemplo, não é permitido. Mas sua comercialização é.
No entanto, as empresas do setor afirmam estar em "uma espécie de vácuo legal". Na Espanha, os produtos de CBD são comercializados apenas como cosméticos ou produtos industriais, embora em muitos casos sejam considerados suplementos alimentares, explicam.
Além disso, uma decisão de 2020 do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) endossa sua comercialização. Ela esclarece que a comercialização de CBD, um produto legalmente fabricado e comercializado em outros Estados-Membros sem riscos à saúde suficientemente comprovados, não pode ser proibida.
Indústria na Espanha
Esse negócio desconhecido em nosso país está começando a crescer por meio de empresas de rua que vendem esse derivado da cannabis em duas formas: como produto cosmético (cremes e óleos) ou como produto ingerível (flores e óleos também).
Este último é o mais procurado pelos consumidores, segundo Jorge Durán, fundador da Serenity, empresa de óleo CBD premium que nasceu em meio à pandemia de Covid e no auge do boom desse novo setor.
A Tía María é uma das empresas que vende flores de cânhamo com CBD. Atualmente, conta com 33 franquias abertas na Espanha, a grande maioria no norte do país, e elas se tornaram o melhor exemplo do boom do setor. "Há dois meses, tínhamos apenas cinco franquias. Agora são 33 e temos mais 15 pendentes", disseram Daniel e José, os fundadores da empresa, ao EL ESPAÑOL-Invertia.
Também está se tornando comum ouvir comerciais de televisão de algumas dessas empresas. É o caso dos Laboratórios Naturasor, que está emergindo como a empresa espanhola líder no processamento de cannabis para fins terapêuticos. Desenvolve, entre outros, a linha Origin de produtos cosméticos e medicinais. Esses produtos estão ganhando popularidade entre atletas de elite.
Empresas do setor defendem as propriedades medicinais do CBD: ele é anti-inflamatório, antioxidante, neuroprotetor e contribui para o relaxamento psicofísico. E a maioria alerta que esses produtos não se destinam a substituir nenhum tratamento médico.
Negócios nos EUA
Na Espanha, esse negócio ainda está engatinhando, embora o interesse esteja crescendo. "A Espanha está atrasada em relação a muitos países. Há mais de 40 países onde é regulamentado, e na Alemanha é encontrado até em postos de gasolina", diz Jorge Durán.
É verdade que está mais consolidado em outros países. Por exemplo, nos EUA, já movimenta mais de US$ 2 bilhões e a expectativa é de que chegue a US$ 20 bilhões até 2025, segundo a consultoria de cannabis BDSA.
Na verdade, é um setor tão em expansão que empresas e personalidades aderiram à onda do CBD. A principal delas é a Moolson Coors, a cervejaria multinacional que opera a La Sagra na Espanha. Ela entrou no negócio de cerveja com CBD com outra empresa e já está presente em 17 estados dos EUA. Até a Coca-Cola considerou entrar no segmento de bebidas com CBD.
No segundo caso, os exemplos são mais abundantes. Justin Bieber anunciou que está investindo em cigarros de maconha pré-enrolados que ele chama de "Peaches", nome de uma música de seu álbum mais recente. E Gwyneth Paltrow e Rosario Dawson estão participando da Cann, fabricante de bebidas com infusão de THC.
Oportunidade política
Voltando ao projeto de lei em debate no Congresso, o Observatório Espanhol de Cannabis Medicinal acredita que é urgente regulamentar o uso medicinal da cannabis. Primeiro, para os pacientes que dela necessitam, e segundo, devido ao surgimento de um mercado negro que desrespeita a lei.
"Regular esse mercado, do ponto de vista econômico, significa criar empregos e arrecadar dinheiro na forma de impostos", diz Cristina Sánchez, porta-voz e professora de Bioquímica e Biologia Molecular da Universidade Complutense de Madri.
Embora o observatório não esteja desistindo. Apesar de saber que a Espanha está muito atrás de outros países nesse tipo de regulamentação, eles acreditam que nosso país acabará aprovando regulamentações para o uso terapêutico da cannabis com base nas "evidências científicas" existentes.
A lista de países que aprovam regulamentações nesse sentido continua crescendo. O mais recente é a Costa Rica, que deu sinal verde para legalizar o uso da cannabis para fins medicinais e terapêuticos e do cânhamo para fins alimentícios e industriais.
Talvez a Espanha se junte a nós mais tarde. Mas, enquanto isso, o negócio da cannabis que não dá barato continua crescendo em nosso país.